A humanidade pode estar tirando o planeta da excepcional estabilidade ambiental em que ele se encontra há 10 mil anos e lançando-o numa zona turbulenta com consequências "catastróficas". O novo alerta é feito por um grupo internacional de 29 cientistas, em artigo nesta semana na revista "Nature".
O time reúne alguns dos maiores especialistas no sistema terrestre, entre eles o holandês Paul Crutzen, Nobel de Química em 95 por seu trabalho sobre a camada de ozônio.
Eles identificaram nove fatores-chave do funcionamento do planeta que não deveriam ser perturbados além de um certo limite para que a estabilidade ambiental que permitiu o florescimento da civilização continue por milhares de anos.
Acontece que, dos nove "limiares planetários", como o artigo chama esses fatores, três já foram excedidos de longe: a mudança climática, a perda da biodiversidade e a alteração no ciclo do nitrogênio. Sobre dois deles, a poluição química e o lançamento de aerossóis na atmosfera, não há informação suficiente.
Outros três - uso de água doce, mudança no uso da terra e acidificação dos oceanos - ainda não tiveram seus limites ultrapassados, mas terão, se as atividades humanas mantiverem o ritmo e o caráter atuais. Um único limiar, a destruição do ozônio estratosférico, está sendo revertido aos valores pré-industriais.
O ciclo do nitrogênio não costuma aparecer entre as pragas ambientais mais citadas. No entanto, os pesquisadores, liderados por Johan Rockström (Universidade de Estocolmo), apontam que a quantidade desse gás removida da atmosfera para uso humano - quase tudo como fertilizante para a agricultura - já é quatro vezes maior do que o limite proposto.
"É mais do que os efeitos combinados de todos os processos [naturais] da Terra", escrevem os autores. Nos fertilizantes, o nitrogênio é convertido a uma forma reativa e acaba no ambiente, poluindo rios e zonas costeiras e formando óxido nítrico, um gás-estufa. Outro nutriente importante, o fósforo, também está tendo seu ciclo alterado, embora haja "grandes incertezas" sobre qual seria seu limite.
O grupo aponta que o fato de "apenas" três limiares terem sido cruzados não é garantia de que o mundo não sofrerá mudanças catastróficas. Afinal, há múltiplas interações entre os limiares. "Transgredir a barreira do nitrogênio-fósforo pode erodir a resiliência de alguns ecossistemas marinhos, potencialmente reduzindo sua capacidade de absorver CO2, afetando assim a barreira climática."
(Folha de SP, 26/9)
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